(FOLHAPRESS) – Ex-prefeito de Belo Horizonte e segundo colocado nas pesquisas ao governo de Minas Gerais, Alexandre Kalil (PSD) diz que decidiu fechar palanque com Lula após convite do ex-presidente e que avisou a ele que nunca tinha votado no PT. “Foi a primeira frase que disse a ele. E ele falou: então agora você vai votar.”
À Folha de S.Paulo Kalil, que viu nesta a diferença para Zema recuar de 28 para 20 pontos na pesquisa Datafolha, diz não ver constrangimento em críticas feitas por ele ao PT em eleições anteriores e que a aliança ocorre por afinidade programática. “Se Bolsonaro me chamasse para ser candidato dele, eu não seria.”
Para ele, seu principal rival, o governador Romeu Zema (Novo), “adaptou-se muito rapidamente” à velha política ao recusar aliança com Jair Bolsonaro (PL) nestas eleições. O ex-prefeito diz ainda não acreditar que o voto “Luzema”, de eleitores de Lula em Zema, vá prosperar e avalia que pedidos de indiciamento em CPIs durante seu mandato foram um pedido político “capitaneado pelo Palácio Tiradentes”.
P. – O sr. já declarou que nunca votava no PT. Já nessas eleições fechou palanque com Lula. O que mudou?
ALEXANDRE KALIL – Nunca declarei que não votava no PT. Disse que nunca votei. Principalmente em Minas, que a gente votava sempre no PSDB, tanto é que ele reinou aqui uns 13 anos [em referência às vitórias nas eleições para o governo do estado de 2002, 2006 e 2010, que somaram 12 anos]. Mas nunca declarei que não votaria, e essa foi a primeira frase que falei ao Lula: nunca votei no PT. E ele falou: então agora você vai votar.
P. – Nas suas últimas campanhas, o sr. fez várias críticas ao PT.
AK – Não há menor constrangimento nisso. O PT foi meu adversário em duas campanhas e era tratado como qualquer adversário eleitoral. Inclusive o Lula veio para a TV pedir voto para o meu adversário. Mas nunca tive ataque pessoal e nunca fui radical. Até penso que o voto do PT na minha eleição de 2016 veio por gravidade para mim [no segundo turno], porque meu adversário era o PSDB, mas sem apoio formal. Critiquei porque era meu adversário.
P. – Sua campanha tem usado bastante a estratégia de colar sua imagem à do ex-presidente Lula. Mas até agora isso não surtiu efeito nas pesquisas. Como pretende reverter isso a poucos dias do primeiro turno?
AK – Não vai haver mudança nenhuma enquanto a população não entrar na eleição. Não é colar. Temos uma visão de mundo que hoje está muito polarizada. Tenho uma visão de mundo que se aproxima do presidente Lula. O governador de Minas tem uma visão muito próxima da do Bolsonaro. Talvez se o presidente Bolsonaro me chamasse para levantar da cadeira e ser candidato dele, eu não seria.
P. – Não teria nem como, sou a favor da máscara, sou contra cloroquina, a favor da vacina e do isolamento. Como iria conversar com ele e fazer campanha?
AK – Estou fazendo campanha com Lula porque temos uma facilidade programática de conversar na mesma língua. O meu plano social está colocado, é o que realizei em Belo Horizonte, não como aliado do Lula, como prefeito de Belo Horizonte.
P. – Mas diante dessa dificuldade, pretende adotar uma nova estratégia?
AK – Tem pesquisa de cerca de 30, 16 e 9 [pontos de distância], Folha de S.Paulo, Globo e Record, as três na mesma semana. Estou muito tranquilo. Não faço malabarismo político nem sou um estrategista mercadológico, e isso nunca vou fazer. Faltam 12 dias, 12 dias em que a população entra na pesquisa e vai ver programa [eleitoral] na TV que não estava assistindo.
P. – Como o sr. vê a preferência de parte do eleitorado de Lula por Zema, o chamado “Luzema”? Isso aí na última eleição foi desmentido, 87% das urnas que votaram no Pimentel [candidato do PT no estado] votaram no Haddad [candidato do mesmo partido à Presidência].
P. – É um movimento que não deve se confirmar?
AK – Acho que não. Pode ser desconhecimento. Não acho que um cara que agrediu tanto o Lula vai ter apoio se souberem o que ele falou e que há outro candidato.
P. – Como o sr. vê a postura do governador nesse cenário?
AK – Zema tem procurado adotar uma postura de neutralidade em relação à disputa nacional. Acima da política, tem a vida da gente. Não consigo virar as costas para quem foi meu amigo por três anos e oito meses por uma questão eleitoral. Essa postura dele é normal na velha política. Ele se adaptou à velha política muito rapidamente. Eu, com a minha idade, não conseguiria olhar para a cara dos meus amigos e meus filhos se tomasse um comportamento desses.
P. – Zema disse que o sr. fez aliança porque não tem luz própria.
AK – Eu me aliei abertamente, pegando o ônus e o bônus. Ele deve ter mais luz do que eu. Mas tem uma coisa que nunca fui: amigo de ocasião e oportunista.
P. – Refere-se a ele com Bolsonaro?
AK – Sim. E me orgulho de ter me tornado amigo do Lula aos 63 anos.
P. – O sr. tem um percentual de rejeição maior do que Zema. A que atribui essa avaliação?
AK – Não sei. É difícil responder pesquisa que diz que minha rejeição está aumentando. Baseado em quê? Saio do poder com aprovação espetacular na prefeitura. Sou um cara que gosta do pragmatismo. Acho que 30% é uma rejeição bem razoável pelo meu temperamento. Estou muito satisfeito com ela, não me incomoda.
P. – Na TV, o sr. fala que muitos o chamam de ‘estouradão’. Essa imagem o prejudica?
AK – Meu temperamento me levou a ser um dos prefeitos mais votados da história dessa cidade e de repente vou falar que está me prejudicando? Seria uma ingratidão a mim mesmo. O que prejudica é meu desconhecimento no interior.
P. – E o sr. tem um plano em relação a isso?
AK – Zero. A TV vai mostrar, e o povo vai decidir.
P. – A dívida do estado já chega a R$ 150 bilhões. Quais seus planos para resolver?
AK – Regime de recuperação fiscal específico para a situação de Minas Gerais. Não tem outra solução. A proposta levada à Assembleia não leva em consideração nenhuma especificidade. Foi feita e se adere, como se joga uma cola na parede. É uma fraude política e eleitoreira. Queria que qualquer pessoa me falasse como diante do regime de recuperação fiscal vai abrir seis hospitais. Se alguém me responder isso, eu me calo.
P. – Na sua gestão na prefeitura, chamou a atenção a postura adotada na pandemia, com medidas restritivas, o que fez Belo Horizonte ser uma das capitais com menos mortes pela Covid. Ao mesmo tempo, muitos críticos falam que faltou um plano de retomada do comércio.
AK – Temos números. Entre as empresas que fecharam e abriram durante a pandemia, o saldo é de 230 mil empresas a mais. Na carteira assinada, a diferença entre o pré-pandemia e o pós-pandemia é de 56 mil carteiras assinadas a mais. E um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais comprovou que quem fosse mais duro em relação à pandemia ia ter uma retomada econômica mais rápida. E no anuário de 2021 da Frente Nacional dos Prefeitos aparece que, enquanto São Paulo cresceu 2,5% e o Rio encolheu 0,2%, Belo Horizonte cresceu 5,2%.
O sr. durante a sua gestão foi alvo de duas CPIs na Câmara de Vereadores e de alguns pedidos de indiciamento. Está lá no Ministério Público. Na CPI da BHTrans, o contrato que estão pedindo indiciamento foi assinado em 2008. No contrato da CPI da Covid quero lembrar ao Brasil inteiro que não comprei um respirador e não tenho uma investigação. Falo e repito: quem tem medo de indiciamento é bandido, o que não é o meu caso. Foi um pedido político, capitaneado pelo Palácio Tiradentes.
P. – Na sua campanha à prefeitura, o sr. falava muito que iria abrir a caixa-preta da BHTrans [empresa de transporte e trânsito]. O sr. acabou por extinguir a BHTrans, mas ainda existem críticas em relação ao transporte público. Em vez de abrir a caixa-preta, eu vou acabar com ela. Foi o que eu fiz. Quando eu deixei o projeto pronto, eram R$ 140 milhões de subsídios. E por política, com medo de eu ter um efeito muito positivo -porque era algo espetacular, eu ia congelar o preço da passagem até acertar tudo com todos e estava tudo acordado-, hoje o subsídio é de R$ 260 milhões, em vez de R$ 140 milhões. O problema do transporte público não é só de Belo Horizonte, é do Brasil inteiro.
P. – Qual deve ser a principal bandeira da sua gestão?
AK – Saúde e infraestrutura. Não pode faltar remédios e hospital para esse povo pobre. A poucos dias da eleição, estavam faltando 41 itens na Farmácia de MG.
P. – O sr. iniciou sua campanha sem apoio da bancada federal do seu partido, o PSD, e sem o apoio explícito de Rodrigo Pacheco [presidente do Senado, que é do PSD]. Isso não mostra um racha?
AK – A única relação que tenho com meu partido se chama Gilberto Kassab. Tudo o que ele falou comigo, cumpriu. Os deputados federais do PSD se empanturraram de cargos e de emendas do orçamento secreto. Eles têm toda a razão de ficarem contra mim e têm que apoiar quem entregou cargo e orçamento secreto para eles.
Raio-X
Alexandre Kalil, 63 Eleito prefeito de Belo Horizonte em 2016 pelo PHS, partido extinto em 2019, entrou para o PSD no mesmo ano e foi reeleito em 2020. Antes, presidiu o Atlético-MG de 2008 a 2014. Comandou a empreiteira Erkal, fundada pela família.